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Textos

Pulseiras prateadas

Ao descer do carro, percebi na rampa da garagem, próximo ao canto do edifício, ele esticado no chão junto a uma poça de sangue. Rosto voltado para baixo, braços ao lado corpo, em uma atitude de quem não tentara se defender.

Sozinho. Ninguém o acompanhava. Comecei a gritar ali mesmo, alucinada. Cheguei perto. Respirava, mas não se mexia. Sou médica! Tenho de fazer alguma coisa pensei.

Preciso parar de gritar e agir. Corri na frente do edifício, o porteiro veio ao meu encontro e perguntei se chamaram o SAMU. Sim, disse ele, há cerca de uma hora e meia. Não têm condições de vir agora.

Vamos levá-lo, disse ao amigo que me acompanhara e ele, rapidamente, colocou seu carro próximo ao corpo. Forrei o banco traseiro do carro com o tapete do chão. Porque me preocupei em forrar o estofamento do carro se ele está morrendo? Meu Deus, o que estou fazendo, pensei. O colocamos na mesma posição no banco traseiro, com cuidado para não mexer muito sua coluna. Saímos voando para o pronto socorro. Não havia sirene_ nem precisava. Eu berrava tanto, descontrolada que fazia o mesmo efeito.

Gesticulava enlouquecida para que os carros saíssem da frente. Depois de longo tempo paramos no pronto socorro e lá haviam outros médicos, o que me libertava da responsabilidade solitária e do sofrimento adicional.

Depois de uma eternidade esperando, percebi que uma jovem médica, equilibrando-se em um elegante sapato de salto alto, caminhava em direção à sala em que ele estava. Sorridente, conversando com um pequeno grupo de jovens que a acompanhavam, sacudia os braços parcialmente cobertos por reluzentes pulseiras prateadas. Rebolando, lentamente atravessou o saguão e entrou na sala. Entrei atrás. Ela parou de conversar apoiou seu braços na grade da cama e me olhando perguntou:_ O que aconteceu com ele?

Se atirou do quarto andar e está tomando anticoagulante por ter sofrido um infarto cerebral há um mês, informei. _Então não adianta fazer nada por ele, ela respondeu, mesmo sem tocar uma de sua mãos empulseiradas no paciente. Como assim, argumentei. Ele está vivo! Ela removeu o colar de proteção que haviam colocado no pescoço dele, chamou o guarda e pediu que me retirassem da sala. Antes de sair a ouvi dizer:_por pouco tempo.
E como eu a odiei.

Jane Ulbrich
28/03/2016

 

 


 


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